Exibido na Mostra de Cinema Documental Panorama 2010.
Passagem na Cinemateca Portuguesa no dia 17 de Novembro 2010.
Folha de Sala:
Lugar/Vazio
Realização e montagem de Luís Mendonça
Com Teresa Carvalho
Produção Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH-UNL)
Junho de 2009
Duração: 7 minutos
A Escola Secundária da Cidade Universitária (ESCU) foi criada em Outubro de 1980. Alunos e professores instalaram-se em pré-fabricados de madeira certos da situação provisória da escola.
Se até 1985 a oferta estava limitada ao 12.º ano, a partir daí os professores passaram a leccionar, nas mesmas instalações, os três anos do ensino secundário, a que se somaram cursos de formação profissional. Apesar das condições precárias, a ESCU conseguiu afirmar-se como uma das mais bem sucedidas escolas secundárias do país. Graças à união de professores e alunos, a extinção da ESCU pelo Ministério da Educação (ME) foi sendo sucessivamente adiada.
No ano lectivo de 2002/2003, de nada valeram os protestos de alunos, pais e professores contra a decisão do ME em fundir a ESCU com a Escola Secundária Padre António Vieira. Alguns pavilhões foram desmontados e transportados, como as pessoas, para a sua nova morada. A remoção dos restantes pavilhões foi lenta. Deixado ao abandono, o espaço onde gerações de alunos fizeram o secundário foi invadido por carros vindos das faculdades vizinhas.
Começava deste modo a primeira versão, que apelidei de “pré-fabricada”, de Lugar/Vazio, pequeno filme realizado no âmbito do mestrado de Cinema e Televisão na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Uma conversa com o Professor José Manuel Costa fez-me mudar de direcção: em vez de traçar o historial desta escola onde gerações de alunos se formaram, entre eles, eu, aventurei-me antes numa reflexão fílmica sobre a memória de um espaço. Procurei captar todos os sinais da passagem da ESCU no tempo e no espaço, o que deu origem a um exercício áudio/visual sobre os sons/palavras que pertenceram – ainda pertencerão? – à escola extinta e sobre as texturas das construções deslocadas, do asfalto do parque de estacionamento em contraponto com o “plano negro” da ardósia do velhinho quadro de giz. Enfim, perante a impossibilidade de filmar um lugar que já não existe, pretendi, com o cinema, devolver a ESCU ao seu tempo e ao seu espaço.
Para criar o ajuste cinemático entre dois espaços (um mental e outro concreto) recorri a uma montagem desencontrada de som e imagem, posta em evidência pelo travelling fundido que divide o filme em dois. Inspirado na reflexão de Chris Marker em torno dos conceitos de espaço e memória, ou na sua obsessão por Vertigo, e em modesta sintonia com a dialéctica que encontrei em Ruhr de James Benning entre o primitivo e o moderno, tentei que a concepção desta curta-metragem girasse em torno das ideias-foça de estagnação (o plano fixo), fragmentação (imagem/som), deslocação (de um espaço áudio/visual para outro/de uma escola para outra) e repetição (o rewind, tendencialmente construtor ou desconstrutor…, do dispositivo mnemónico).
Por outro lado, ao pôr a nu o processo de montagem, com os cliques no mouse e a manipulação de som em off, tive como objectivo esboçar uma espécie de fora de campo sonoro, potenciando no espectador a remissão para aquilo que não é dito ou para lá do que é mostrado, e fazer do jogo de corta e cola da montagem uma possibilidade de metáfora para a história desse copy-paste abrupto entre duas moradas. Assim sendo, pode-se afirmar que, em relação àquela primeira versão, mantive apenas a intenção de realizar um filme inacabado, pré-fabricado. Exactamente como a extinta escola, que ainda viverá intacta dentro de alguns de nós.
© Luís Mendonça